Nos últimos anos ficou cada vez mais evidente os perigos associados ao uso incorreto e indiscriminado dos produtos fitossanitários na agricultura.

Por isso, tem-se aumentado a preocupação por parte dos consumidores sobre a qualidade dos produtos de origem agropecuária, o que tem impulsionado o consumo de produtos originados da Agricultura Orgânica, ou seja, produzidos sem a utilização de produtos fitossanitários sintéticos.

A Agricultura Orgânica é um sistema de produção agrícola que se baseia em diversos preceitos, como por exemplo:

  • A produção de alimentos livres de resíduos de pesticidas (fungicidas, inseticidas e herbicidas).
  • Adubações de solo baseadas em materiais orgânicos (esterco, húmus, biofertilizantes, etc).
  • Controle de doenças e pragas utilizando produtos naturais ou o controle biológico.
  • Manejo de plantas daninhas baseado em capinas seletivas, roçagem, etc.

A Agricultura Orgânica teve origem a partir dos trabalhos do pesquisador Sir Albert Howard, durante as décadas de 20 a 40, na Índia.

Como princípios básicos, a Agricultura Orgânica busca a manutenção da fertilidade do solo e da sanidade dos vegetais por meio da adubação orgânica, utilizando também a diversificação de espécies vegetais e a rotação de culturas, como alternativas de manejo.

E uma pesquisa realizada em 2017 pelo Conselho Brasileiro da Produção Orgânica e Sustentável, verificou-se que cerca de 15% da população brasileira é consumidora assídua de produtos da Agricultura Orgânica.

A maior parte desses consumidores estão no Estado do Rio Grande do Sul, o qual apresenta a maior porcentagem, contabilizando 39% da população deste estado.

Além disso, o mercado de produtos orgânicos está em franca expansão, com a criação de diversos nichos de mercados e que vão além dos alimentos.

Entretanto, a olho nu não é possível discernir a origem do produto, se ele é oriundo da Agricultura Orgânico ou Convencional.

Diante deste cenário, e com o intuito de proteger o consumidor, a legislação brasileira se viu obrigada a regulamentar a Agricultura Orgânica e a comercialização dos seus produtos.

A solução encontrada, se deu através da certificação dos produtos de origem orgânica.

Legislação Brasileira sobre a Agricultura Orgânica

A legislação brasileira com foco na Agricultura Orgânica começou a ser formada no ano de 2003, com a publicação da Lei nº 10.831/2003, que representou o marco legal para a Produção Orgânica no Brasil.

Logo em seguida, foi publicado o Decreto nº 6.323/2007, que detalha a Lei nº 10.831 e fornece os subsídios legais para:

  • O processo de certificação para a Agricultura Orgânica
  • A conversão agroecológica
  • Os insumos permitidos
  • As punições, caso as exigências não sejam atendidas.

Além disso, diversas Instruções Normativas (IN) também foram publicadas com o objetivo de subsidiar a Lei nº 10.831/2003, nos diversos segmentos da Agricultura Orgânica, dentre elas as principais são:

  • IN 46/2011: Estabelece o regulamento técnico para os sistemas de Agricultura Orgânica de produção. Além de, enumerar as substâncias e as práticas permitidas na atividade.
  • IN 17/2009: Aprova as normas técnicas para a obtenção de produtos da Agricultura Orgânica com origem no extrativismo sustentável.
  • IN 18/2009: Estabelece o regulamento técnico para o processamento, armazenamento e transporte de produtos da Agricultura Orgânica.
  • IN 19/2009: Aprova os mecanismos de avaliação e criação dos Organismos de Avaliação da Conformidade (OAC), Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (OPAC) e Organização de Controle Social (OCS).

A Legislação Brasileira prevê ainda três diferentes mecanismos para a certificação da Agricultura Orgânica.

As certificações somente podem ser realizadas por instituições devidamente credenciadas ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

Sendo assim, a avaliação da conformidade orgânica pode ser feita através de:

  • Certificação por Auditoria
  • Sistemas Participativos de Garantia
  • Controle Social para Venda Direta

Todos estes mecanismos servem para dar segurança e garantia ao consumidor dos produtos da Agricultura Orgânica, uma vez que estes produtos, na maioria das vezes, possuem um preço acima da média de mercado.

Neste sentido, a legislação brasileira estabeleceu a certificação como o mecanismo para dar confiabilidade aos produtos da Agricultura Orgânica.

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Mecanismos de controle para a garantia da Agricultura Orgânica

 

Certificação por Auditoria

Na prática, a Certificação por Auditoria ocorre da seguinte forma:

Um agricultor contrata uma empresa para realizar a certificação, a qual exige a elaboração de um Plano de Manejo Orgânico (PMO), que deve conter todas as informações relativas ao sistema de produção.

O PMO deve ser elaborado para a propriedade como um todo, mesmo que o produtor ainda não tenha convertido toda a sua propriedade ao sistema de Agricultura Orgânica de produção.

Após a sua elaboração, o PMO precisa ser aceito pela certificadora para que sejam iniciadas as vistorias ou inspeções, que podem ser:

  • Programadas, quando o produtor é notificado com antecedência.
  • Aleatórias, quando as inspeções são realizadas sem aviso prévio.

Finalizado o período das inspeções, o fiscal elabora um relatório técnico a respeito do modelo de Agricultura Orgânica adotado pela propriedade, o qual pode ser aprovado ou não pela certificadora.

No caso de aprovação, a produção proveniente da propriedade certificada estará apta a usar o selo único da conformidade orgânica abaixo:

Agricultura orgânica e selo de certificação orgânica por auditoria

 

Certificação pelo Sistema Participativo de Garantia

Neste mecanismo de garantia, a verificação da conformidade da Agricultura Orgânica é feita para um grupo de interessados. Neste caso, os agricultores, que devem obrigatoriamente ter algumas características específicas, como:

  • Estarem em regiões geográfica próximas
  • Possuírem produções semelhantes (por exemplo: produtores de uva da região da serra gaúcha)
  • As propriedades devem possuir tamanho semelhantes.

Os produtores também necessitam elaborar um PMO, que precisa ser aprovado para então dar seguimento as inspeções, que ocorrem da mesma forma descrita anteriormente.

Após todo o processo de avaliação da conformidade, os produtos certificados também recebem o seguinte selo:

Agricultura orgânica e selo de certificação orgânica por sistema participativo

 

Controle Social de Venda Direta

O Controle Social de Venda Direta é uma exceção ao sistema de certificação da Agricultura Orgânica, porque não envolve uma empresa certificadora.

Este modelo, que permite a venda de produtos da Agricultura Orgânica, é único no mundo.

O Controle Social a Venda Direta regulamente a comercialização de produtos de origem orgânica sem o processo de certificação propriamente dito.

O agricultor interessado precisa estar associado a uma Organização de Controle Social (OCS), que deve estar obrigatoriamente registrada no MAPA, assim como as certificadoras.

A OCS é a responsável pela avaliação da conformidade, tendo a mesma exigência dos níveis anteriores.

Os agricultores também precisam elaborar o PMO, que deve ser aprovado pela OCS.

Contudo, as inspeções são realizadas aos pares por membros da própria OCS, que são na maioria das vezes, os próprios produtores rurais.

Os agricultores que optam pelo Controle Social da Venda Direta não podem vender seus produtos a terceiros.

Este sistema de avaliação da conformidade apenas prevê a venda direta em feiras livre e em programas locais para merenda escolar.

Além de tudo, não permite a utilização do selo único. Todos os produtores que optarem por esse sistema recebem uma declaração de cadastro de produtor vinculado a uma OCS.

Essa declaração pode ser exigida pelos consumidores, no momento da compra, para atestar que determinado produtor realmente é vinculado a um sistema de Agricultura Orgânica de produção.

Passo-a-passo para a certificação da Agricultura Orgânica

No Brasil, o processo de certificação da Agricultura Orgânica é feito por uma certificadora devidamente acreditada pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO) e credenciada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

No exterior, o órgão responsável pelo credenciamento das certificadoras é a Federação Internacional do Movimento da Agricultura Orgânica (IFOAM), uma organização que surgiu no ano de 1972.

Apesar da IFOAM ser um órgão instituído a muito tempo, o Brasil foi um dos primeiros países do mundo a criar um regulamento nacional para a Agricultura Orgânica.

O processo de inspeções ou vistorias pode ser realizado pelas certificadoras durante o processo de certificação ou por membros do MAPA, Anvisa e outros órgãos federais, estaduais e municipais, com o objetivo de fiscalização.

Toda a cadeia envolvida na Agricultura Orgânica é passível de vistoria, por isso é importante que todos os envolvidos estejam comprometidos com este modelo de produção.

Em nível de propriedade rural, as inspeções ocorrem nas áreas de produção, envolvendo o tipo de manejo aplicado e principalmente, os maquinários e insumos utilizados.

Por exemplo, em propriedades que optaram pela Conversão Parcial ou Paralela, onde ainda há um sistema de produção convencional associado, os insumos da Agricultura Orgânica e os da Agricultura Convencional devem ser armazenados separadamente.

O maquinário pode ser compartilhado, desde que higienizado antes de ser utilizado nos diferentes sistemas de produção. Enquanto que os implementos de pulverização são proibidos de compartilhamento entre essas áreas.

Durante o processamento dos produtos da Agricultura Orgânica, são observados aspectos relacionados as boas práticas sanitárias, no que diz respeito aos produtos utilizados para limpeza, conservação e embalagem.

Não só no processamento, como também em nível de propriedade e nos pontos de venda estão previstas coletas de amostras para análises laboratoriais.

Nos postos de venda, os produtos oriundos da Agricultura Orgânica devem ser armazenados separados dos Convencionais, sem que haja contato físico entre eles.

Na mesma forma, a disposição dos produtos nas gôndolas de supermercados prevê que os mesmos sejam separados. Se houver a necessidade de refrigeração, deve haver um local exclusivo para os produtos da Agricultura Orgânica, o qual deve ser devidamente identificado.

Penalidades previstas no descumprimento da legislação

A legislação existe por um motivo, ou seja, garantir padrões mínimos aceitáveis para que um sistema de produção e comercialização seja enquadrado como Agricultura Orgânica.

Além disso, diversas etapas posteriores a produção dos alimentos também está sujeita às mesmas penalidades, caso coloquem em risco a qualidade final do produto.

Se por acaso, durante uma inspeção de rotina, um agente do MAPA encontrar alguma irregularidade, está previsto em lei que pode haver:

  • Advertências
  • Autuações
  • Apreensão de produtos
  • Retirada dos produtores do cadastro nacional
  • Suspensão da empresa credenciadora
  • Multas que variam de R$ 100 a 1 milhão

Quando um fiscal encontra indícios de adulteração, falsificação, fraude ou inobservância do disposto nas normas legais, algumas medidas cautelares podem ser adotadas, como:

  • Apreensão, de forma temporária dos alimentos ou produtos
  • Interdição, temporária de estabelecimentos (propriedades rurais, entrepostos, locais de processamento, postos de venda, etc.)
  • No caso dos agricultores vinculados a OCS, ocorre a retirada temporária do cadastro destes agricultores
  • No caso de agricultores certificados, ocorre a suspensão temporária do seu credenciamento junto ao organismo da avaliação da conformidade orgânica

As medidas cautelares citadas a cima são temporárias. Elas vigoram apenas até que se finalizem as análises, vistorias ou auditorias, para que se conclua a respeito dos indícios que as geraram.

Caso seja comprovado que ocorreram adulteração em algumas das etapas de produção, processamento e comercialização dos produtos oriundos do sistema de Agricultura Orgânica de produção, é previsto em lei a aplicação das seguintes sanções:

  • Advertências
  • Multas de até R$ 1.000.000,00
  • Suspensão da comercialização do produto como oriundo da Agricultura Orgânica
  • Condenação de produtos, rótulos, embalagens e matérias-primas
  • Inutilização do produto
  • Suspensão do credenciamento, certificação, autorização, registro ou licença.
  • Cancelamento do credenciamento, certificação, autorização, registro ou licença

Como você pode observar, as penalidades para o descumprimento da legislação da Agricultura Orgânica são severas, mas elas servem para auxiliar o cumprimento da lei e garantir a qualidade dos produtos orgânicos comercializados em território nacional.

Quando os produtos da Agricultura Orgânica são destinados a exportação, eles seguem as leis que regem cada país. E a sua responsabilidade fica a cabo da IFOAM.

Técnicas de Vendas e Marketing no Agronegócio
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