Qualquer agricultor sabe da importância que a adubação nitrogenada possui para as culturas agrícolas, sejam elas anuais ou perenes.
E essa importância está relacionada ao fato do nitrogênio ser o nutriente extraído do solo em maior quantidade pela maioria das espécies de plantas cultivadas.
Mas se por um lado é o nutriente extraído em maior quantidade, por outro lado o nitrogênio é o único nutriente de plantas que não aparece na análise química da fertilidade do solo, porque ainda não se conhece um método adequado para a análise do teor de nitrogênio no solo.
Isso faz com que com a recomendação da adubação nitrogenada se torne mais complexa, e seja realizada por meio de critérios como o teor de matéria orgânica do solo, a quantidade de nitrogênio extraída pela cultura, a expectativa de produtividade e a espécie cultivada anteriormente.
Por isso, para compreender como fazer uma recomendação adequada de adubação nitrogenada, você precisa entender o caminho que o nitrogênio faz, do fertilizante até a absorção pela planta, e as possíveis perdas que acontecem nesse processo.
Neste artigo, portanto, serão abordados os seguintes temas sobre adubação nitrogenada:
- Principais fontes de nitrogênio para as culturas agrícolas
- Épocas e modos de aplicação dos fertilizantes nitrogenados
- Adubação nitrogenada complementar por aplicação foliar
- Principais perdas do nitrogênio aplicado via adubação
- Redução das perdas da adubação nitrogenada
- Como o nitrogênio é absorvido pelas plantas?
Respire fundo e conheça a seguir tudo o que você precisa saber sobre as boas práticas da adubação nitrogenada.
Principais fontes de nitrogênio para as culturas agrícolas
Talvez você não saiba, mas o nitrogênio responde sozinho por 78% da composição da nossa atmosfera. Ou seja, 78% do ar que você respira neste momento é nitrogênio.
O problema é que esse nitrogênio está na forma de um gás (N2), que não é aproveitado diretamente pelas plantas. Além disso, os dois átomos de nitrogênio deste gás estão ligados por três ligações covalentes, que para serem quebradas precisam de temperaturas acima de 450°C e de pressão superior a 200 atmosferas, em um processo conhecido como síntese de Haber-Bosch.
Para conseguir essa temperatura e essa pressão, o processo industrial demanda grande quantidade de combustíveis fósseis, o que ajuda a explicar não só o alto custo dos fertilizantes nitrogenados, como também por que o preço destes fertilizantes está atrelado ao preço do barril de petróleo.
Cerca de 1,5% da energia fóssil consumida no mundo é utilizada na produção de fertilizantes nitrogenados.
Após a quebra das três ligações covalentes do gás N2, o primeiro produto do processo industrial é a amônia (NH3), que pode ser utilizada como fertilizante na forma de amônia anidra (que possui 82% de nitrogênio), e que é um composto-chave utilizado na produção de quase todos os fertilizantes nitrogenados.
Partindo da amônia (NH3), os fertilizantes nitrogenados produzidos em sequência conterão o nitrogênio em uma das suas formas básicas: amida (NH2), amônio (NH4+) e nitrato (NO3–).
Entre os principais fertilizantes para a adubação nitrogenada, a ureia [CO(NH2)2], que possui entre 44 e 46% de nitrogênio, é o fertilizante nitrogenado sólido mais consumido no mundo, e possui o nitrogênio na forma amida (NH2).
No Brasil, depois da ureia, são consumidos também o fosfato monoamônico (MAP, 9% de nitrogênio), o sulfato de amônio (20% de nitrogênio), o nitrato de amônio (32% de nitrogênio) e o fosfato diamônico (DAP, 16% de nitrogênio).
A ureia é muito utilizada por ser um dos fertilizantes sólidos mais concentrados, o que reduz o volume de aplicação (e que consequentemente aumenta o rendimento operacional, por causa do menor número de abastecimentos).
Sua elevada concentração proporciona também o menor custo por quilo de nitrogênio aplicado. Os grânulos de ureia geralmente são revestidos com um material protetor para diminuir sua facilidade em absorver a umidade do ar.
O sulfato de amônio possui o nitrogênio na sua forma mais básica, o amônio (NH4+), e é utilizado por ser também uma fonte de enxofre (24% de enxofre).
O MAP é utilizado sobretudo como uma fonte de fósforo (44% de óxido fosfórico) que também contém nitrogênio.
Todos os fertilizantes nitrogenados são altamente solúveis, aumentam a acidez do solo, apresentam índice salino relativamente alto e não deixam efeito residual para a próxima safra.
Épocas e modos de aplicação dos fertilizantes nitrogenados
Praticamente todas as culturas agrícolas já possuem recomendações elaboradas por instituições de pesquisa e órgãos de extensão sobre a quantidade total de nitrogênio que deve ser aplicada ao longo do ciclo da cultura.
E como o nitrogênio não é determinado na análise de solo, essas recomendações de adubação nitrogenada levam em consideração a textura e o teor de matéria orgânica do solo, a expectativa de produtividade da cultura e o aporte de nitrogênio realizado pela cultura anterior, que determina a classe de resposta ao nitrogênio.
Para entender melhor a classe de resposta ao nitrogênio, você precisa lembrar a Lei de Mitscherlich ou Lei dos Incrementos Decrescentes, em que:
“Quando se aplicam doses crescentes de um nutriente, o aumento na produção é elevado inicialmente, mas decresce sucessivamente”
Em outras palavras, é preciso lembrar que quando a quantidade de nitrogênio no solo é baixa, a resposta à adubação nitrogenada pela cultura será maior.
Desta forma, as tabelas de recomendação de adubação nitrogenada possuem as seguintes classes de resposta ao nitrogênio:
Baixa resposta esperada: solos em pousio por dois ou mais anos, solos com cultivo recorrente de leguminosas, solos com uso constante de doses elevadas de adubos orgânicos, culturas perenes com elevados teores de nitrogênio nas folhas.
Média resposta esperada: solos com pH em água menor que 5,6 e que serão corrigidos, solos em pousio por um ano, solos com cultivo anterior esporádico de espécies leguminosas, solos com uso moderado de adubos orgânicos, culturas perenes com teores médios de nitrogênio nas folhas.
Alta resposta esperada: solos arenosos (que possuem altas perdas por lixiviação), solos corrigidos (com pH em água entre 5,6 e 6,3), com muitos anos de cultivo de espécies não-leguminosas, e culturas perenes com baixo teor de nitrogênio nas folhas.
Mas é preciso fazer uma ressalva sobre as tabelas de recomendação da adubação nitrogenada para as culturas agrícolas: muitas destas tabelas foram elaboradas, por meio de experimentos, na década de 90, com híbridos e cultivares que sequer continuam no mercado atualmente, e com manejos culturais completamente diferentes.
Desta forma, considere as tabelas de recomendação apenas como ponto-de-partida, e vá realizando os ajustes pontuais, ao longo das safras, para as demandas nutricionais dos cultivares e híbridos utilizados atualmente, bem como para o sistema de produção adotado na propriedade rural.
Uma vez determinada a dose a ser aplicada, é preciso levar em consideração que como o nitrogênio é o nutriente extraído do solo em maior quantidade na maioria das culturas agrícolas, as doses dos fertilizantes nitrogenados geralmente são elevadas.
Assim, para evitar as perdas do nitrogênio aplicado via adubação e para maximizar o efeito do fertilizante, as doses do fertilizante nitrogenados costumam ser parceladas.
Em geral, utiliza-se 1/5 ou 1/3 da quantidade total na semeadura ou plantio, conhecida também como “adubação de arranque”, e o restante é aplicado em cobertura, entre 20 a 40 dias após a primeira adubação nitrogenada.
As hortaliças, que possuem maior rentabilidade por unidade de área, ciclo mais curto e maior exigência em nitrogênio, geralmente recebem uma adubação de semeadura ou plantio e três ou quatro aplicações em cobertura.
A adubação nitrogenada pode ser realizada em sulco ou a lanço, e como geralmente são realizadas ao menos duas adubações durante o ciclo das culturas (adubação de semeadura e adubação de cobertura), é possível realizar várias combinações entre estes modos de aplicação: adubação no sulco de semeadura e adubação de cobertura em um sulco nas entrelinhas, adubação de semeadura no sulco e adubação de cobertura a lanço, e até mesmo adubação de semeadura e de cobertura a lanço.
Nos últimos anos a adubação nitrogenada no sulco vem sendo substituída pela aplicação a lanço sem incorporação, tendo em vista o maior rendimento operacional da aplicação, o melhor aproveitamento da janela de semeadura e a maior facilidade da operação.
E embora a adubação localizada no sulco de semeadura ou a incorporação do fertilizante aplicado a lanço resultem em menores perdas do nitrogênio, essa é uma decisão que deve levar em consideração a quantidade a ser aplicada, a fertilidade do solo, o número de máquinas disponíveis para as operações agrícolas, a janela de semeadura ou de plantio e as condições do clima e do solo no momento da aplicação.
Adubação nitrogenada complementar por aplicação foliar
A principal forma de fornecimento de nitrogênio para as plantas é por meio da aplicação de fertilizantes sólidos, no sulco, incorporado ou a lanço.
Entretanto, nos últimos anos vários agricultores têm adotado a aplicação foliar de nitrogênio, como forma de adubação complementar, principalmente para a correção de eventuais deficiências, aproveitando as operações de aplicações de outros produtos, como inseticidas ou fungicidas.
A aplicação foliar de fertilizantes nitrogenados para correção de deficiências nutricionais possui maior eficiência quando essa deficiência do nitrogênio é identificada ainda em seus estádios iniciais.
Desta forma, a aplicação foliar, que possui efeito mais rápido que a aplicação via solo e evita um maior comprometimento da produtividade.
Em algumas culturas agrícolas é possível observar uma redução da extração de nitrogênio do solo nos estádios finais do seu ciclo, sobretudo no enchimento de grãos.
Nesse caso, a adubação nitrogenada complementar via foliar também resultar em acréscimos na produtividade.
Principais perdas do nitrogênio aplicado via adubação
Quando a ureia entra em contato com o solo, uma enzima presente no solo, a urease, converte a ureia em amônio (NH4+), mas essa reação química utiliza íons de hidrogênio do solo e libera hidroxilas (OH–), o que faz com que o pH ao redor do granulo de fertilizante atinja valores entre 8 e 9.
Em pH acima de 7, esse amônio (NH4+) originado da transformação da ureia é convertido em amônia gasosa (NH3), que é um gás e também o principal responsável pelas perdas de nitrogênio por volatilização.
Assim, a aplicação de ureia em superfície pode resultar em perdas de 31 a 78% do nitrogênio aplicado, dependendo da umidade do solo, da temperatura do solo e da forma de aplicação. A incorporação da ureia, entretanto, reduz as perdas por volatilização porque ao se difundir no solo em direção à atmosfera, a amônia gasosa (NH3) encontra regiões com pH mais baixo, e é convertido novamente em amônio (NH4+).
Entre os fertilizantes que possuem o nitrogênio na forma de nitrato (NO3–), o nitrato de cálcio [Ca(NO3)2] é o mais utilizado e também pode sofrer perdas de nitrogênio por volatilização, mas por meio de um outro processo que acontece apenas em solos alagados, como no caso do arroz irrigado por inundação.
Em solos alagados, os microorganismos presentes no solo reduzem o nitrato a óxido nitroso (N2O) ou ao gás N2, que são gases perdidos para a atmosfera.
O óxido nitroso (N2O), inclusive, é apontado como um dos principais gases responsáveis pelo efeito estufa.
Em condições de sequeiro, entretanto, as principais perdas de nitrogênio dos fertilizantes a base de nitrato ocorrem por meio da lixiviação, que é o processo de “arraste” ou de “lavagem” do nitrogênio para camadas mais profundas do solo, podendo, inclusive, chegar até ao lençol freático.
As perdas por lixiviação relacionada ao nitrato se devem ao fato do solo ter mais cargas negativas e, consequentemente, maior capacidade de reter cátions (íons com carga positiva) do que ânions (íons com carga negativa, como o NO3–).
Assim, o nitrato fica disponível na solução do solo e também mais suscetível a perdas por lixiviação, ou seja, pode ser levado para camadas mais profundas do solo.
O sulfato de amônio, por outro lado, assim como todo fertilizante que tem o amônio (NH4+) como fonte de nitrogênio, perde pouco nitrogênio por volatilização (porque necessita de um pH muito elevado para ser transformado em amônia gasosa (NH3)) ou lixiviação (porque possui carga positiva e é facilmente retido pelas cargas negativas do solo).
O problema dos fertilizantes a base de amônio é de outra ordem: a acidificação do solo.
Isso acontece porque a reação de nitrificação, que transforma o amônio (NH4+) em nitrato (NO3–) resulta na liberação de íons de hidrogênio (H+) na solução do solo.
E íons de hidrogênio (H+) na solução do solo significa menor valor de pH e maior acidez ativa do solo.
De maneira geral, em solos arenosos e com baixa capacidade de troca de cátions (CTC), ocorrem maiores perdas por lixiviação, independentemente da fonte de nitrogênio utilizada.
Por esse motivo, as doses de nitrogênio precisam ser maiores em solos arenosos.
Redução das perdas da adubação nitrogenada
Para reduzir as perdas da adubação nitrogenada, você precisa levar em consideração fatores como textura e fertilidade do solo, presença ou ausência de restos culturais, umidade do solo, possibilidade de chuvas, entre outros pontos importante.
No caso da adubação nitrogenada a lanço, em cobertura e em cultivo de sequeiro, por exemplo, as perdas por volatilização serão maiores com ureia do que com fontes amoniacais ou nítricas, principalmente se o solo estiver úmido e não chover em seguida.
A ureia aplicada a lanço e sem incorporação, por exemplo, possui menores perdas por volatilização quando a adubação é realizada em solo seco, mas com previsão de chuvas para os próximos dias.
As perdas de nitrogênio são maiores quando a ureia é aplicada em solo úmido e não chover nos três dias seguintes.
Na aplicação em solo úmido, as perdas de nitrogênio seriam menores se a fonte de nitrogênio escolhida fosse o sulfato de amônio.
Para minimizar o potencial de perdas dos nutrientes para o ambiente, as empresas de fertilizantes e as instituições de pesquisa têm investido na criação de fertilizantes de eficiência aumentada (FEA) que, no caso do nitrogênio, buscam evitar e/ou diminuir as perdes nitrogênio por volatilização da amônia gasosa (NH3) e/ou lixiviação do nitrato (NO3–).
Além disso, podem fornecer o nitrogênio de forma constante e gradual às plantas.
Entre estes fertilizantes de eficiência aumentada estão os fertilizantes nitrogenados com adição de um composto chamado tiofosfato de N-(n-butil) triamida, conhecido como NBPT, que inibe a atividade da enzima urease durante o período de uma a duas semanas, reduzindo assim a perda de nitrogênio por volatilização da amônia gasosa (NH3).
Além dos inibidores de urease, existem também os fertilizantes de ação controlada (FLC) e os fertilizantes de liberação lenta (FLL).
As duas tecnologias liberam os nutrientes de forma mais lenta que os fertilizantes normais, tendo como principal diferença que apenas no caso dos fertilizantes de ação controlada a quantidade, o padrão e a duração da liberação do nutriente para as plantas são conhecidos.
Os fertilizantes nitrogenados de ação controlada possuem um padrão sigmoidal de liberação de nitrogênio no solo, com uma primeira fase de liberação lenta, passando para uma segunda fase de liberação mais rápida e, por fim, para uma terceira fase de liberação lenta, com disponibilização total do nutriente.
Durante o processo de fabricação, os fertilizantes nitrogenados são revestidos e encapsulados por uma camada de material insolúvel em água, mas com microporos que permitem o controle da entra e saída de água no grânulo do fertilizante. Como exemplo destes fertilizantes está a ureia recoberta com polímero (URP).
Como o nitrogênio é absorvido pelas plantas?
O nitrogênio é um nutriente móvel no solo, por isso o contato do íon com as raízes das plantas ocorre principalmente por fluxo de massa, ou seja, é arrastado junto com o movimento da solução do solo para a região próxima das raízes, onde fica disponível para a absorção.
Para ser absorvido pelas raízes, entretanto, o nitrogênio precisa estar na forma de nitrato (NO3–) ou de amônio (NH4+).
A forma predominante que a planta absorve, em condições naturais é a do nitrato (NO3–), devido ao processo de nitrificação no solo.
Entretanto, a disponibilidade do nitrogênio na solução do solo depende do pH do solo. A disponibilidade máxima de nitrogênio ocorre na faixa de pH 6 a 7.
Como a maioria dos solos do território brasileiro, principalmente os da região Centro-Oeste, possuem problemas de acidez, a calagem e o controle do pH dos solos possuem grande importância para a absorção de nutrientes.
Um estudo realizado pela Embrapa descobriu que em solos ácidos (com pH menor que 4,5) as plantas absorvem apenas 20% do nitrogênio disponibilizado pelo fertilizante. Já em solos com pH acima de 6,0 o aproveitamento do fertilizante nitrogenado é 100%.
Por esse motivo, todo manejo da adubação nitrogenada começa necessariamente com o controle da acidez ativa do solo, realizando a calagem quando necessário.
Sem o controle da acidez do solo, a eficiência dos fertilizantes nitrogenados é baixa, e como o nutriente pode ser perdido por lixiviação ou por volatilização, você pode estar literalmente jogando dinheiro fora.