Não precisamos encarar o solo arenoso simplesmente como uma área menos nobre da propriedade, ao invés disso, com a adoção de práticas de manejo condizentes com a demanda é possível alcançar alta produtividade sem que ocorra degradação.
No Brasil, o solo arenoso corresponde a quase 6% do total. Pode parecer pouco relevante, mas trata-se de aproximadamente 50 milhões de hectares, ocupando cerca de 15% do Cerrado do Brasil Central.
Sendo assim, não podemos deixar de aproveitar essa área que o solo arenoso abrange apenas por não saber como manejá-lo.
Pesquisadores de todo o país vem desenvolvendo estudos para traçar as melhores estratégias para o cultivo desses solos.
Nesse sentido, destaca-se o estado do Paraná, organizando e promovendo eventos com impacto estadual e nacional com o intuito de disseminar os avanços a respeito do manejo de solo arenoso.
Esses estudos visam entender os processos físicos, químicos e biológicos peculiares do solo arenoso para aperfeiçoar as técnicas de cultivo do solo, adubação e correção da acidez.
O controle da erosão e o aumento do carbono orgânico são alguns dos desafios que temos ao cultivar em um solo arenoso.
Isso ocorre porque são a argila e a própria matéria orgânica, que atuam nos processos de agregação e estabilização de agregados e que são escassas em um solo arenoso, que fazem com que haja maior suscetibilidade à erosão.
Logo, o Sistema de Plantio Direto, através da preconização da manutenção de cobertura do solo e aporte de resíduos vegetais em quantidades suficientes considerando a demanda do local, ganha maior importância, sendo quase um requisito para o sucesso do cultivo do solo arenoso.
Estratégias de correção da acidez, inclusive em subsuperfície, visando neutralizar o Al+3 trocável também são necessárias e vem sendo estudadas.
Além disso, táticas de adubação e irrigação devem obedecer às peculiaridades impostas pelos solos arenosos.
Se você ficou interessado no tema, quer saber os últimos avanços sobre manejo de solo arenoso e como obter altas produtividades, continue lendo esse texto.
O que é um solo arenoso
O solo arenoso é a classe textural mais grosseira, ou seja, com partículas de maior tamanho, devendo ter menos de 15% de argila e mais de 70% de areia
Para ser considerada areia, a partícula do solo deve ter diâmetro entre 2 e 0,05 mm. Ademais, as partículas do solo também são agrupadas em silte (diâmetro entre 0,05 a 0,002) e argila (diâmetro < 0,002 mm).
A determinação do tamanho das partículas do solo e o seu agrupamento em diferentes classes de tamanho é feita por laboratórios especializados em física do solo, seguindo metodologias padronizadas para análise granulométrica.
Para isso, é necessário coletar amostras de solo representativas da área que você almeja determinar a textura. Essa informação é valiosa e não deve ser ignorada, pois é considerada para práticas de manejo essenciais como adubação e irrigação.
Também existe um método prático e fácil de ser empregado no campo, porém não é tão confiável e depende da experiência de quem realizá-lo.
Esse método considera nossa sensação ao tocar a amostra de solo, ou seja, como nosso tato reage ao entrar em contato com as partículas minerais.
Quando adicionamos água a uma pequena porção de solo, quando se trata de solo arenoso, devemos ter uma sensação de aspereza, ou seja, a amostra não é plástica e nem pegajosa.
A sensação de pegajosidade seria sentida caso estivéssemos manuseando solo argiloso. Quando o silte é a classe predominante, há sedosidade e a amostra é ligeiramente plástica e não é pegajosa.
Porém, como já discutimos, esse método é empírico, e caso você esteja interessado em um resultado mais confiável, procure um laboratório que execute análises de solo.
O perfil do solo pode ser inteiramente arenoso como em alguns Latossolos, ou pode ocorrer em apenas uma camada de solo arenoso como nos horizontes E ou A de Argissolos.
Os Neossolos representam uma classe de solo arenoso que geralmente exigem maior atenção quanto aos riscos de degradação, pois comumente são rasos.
Impactos dos solos arenosos na fertilidade
Os menores teores de argila e matéria orgânica em solo arenoso acarretam uma série de mudanças químicas que interferem na fertilidade do solo.
Uma delas é a diminuição da capacidade de troca de cátions do solo (CTC), pois a fração do solo responsável pela maioria das cargas negativas é justamente a argila e a matéria orgânica.
Por isso, os solos arenosos demandam menores doses de calcário e fertilizantes minerais.
A correção da acidez do solo considera a acidez potencial que é aquela que corresponde aos íons H+ E Al+3 liberados pela fase sólida após a adição de calcário até que seja estabelecido o equilíbrio no pH de interesse.
Como há menos cargas negativas no solo arenoso, menos íons ácidos são liberados na solução do solo e menores doses de calcário são exigidas.
Uma lógica semelhante pode ser traçada para os nutrientes K e P, os quais são aportados em menor quantidade ao solo arenoso quando comparado ao argiloso.
No caso do K, sua dose é dependente, sobretudo, da CTC e, como em solo arenoso ela é menor, a exigência do nutriente também é menor.
Por exemplo, considerando o manual de adubação e calagem do Rio Grande do Sul, se a análise de solo apontar 40 mg de K dm-3, o teor de K possivelmente será enquadrado como médio em solo arenoso e como baixo em solo argiloso.
A dose de P é menor conforme se diminui o teor de argila, pois é com ela que o nutriente faz ligações químicas e fica retido. Como no solo arenoso há argila inferior a 15%, menos P faz ligações covalentes com a fase sólida, ficando na solução.
Outro risco oriundo da CTC baixa do solo arenoso é a maior lixiviação dos nutrientes aplicados, podendo contaminar as águas subterrâneas ao mesmo tempo que há desperdício de dinheiro investido em adubos.
Impactos dos solos arenosos em atributos físicos
As principais mudanças de ordem física em solo arenoso em comparação com solo mais argiloso são as menores agregação e armazenamento de água.
A estrutura pouco desenvolvida devido aos teores baixos de argila e matéria orgânica faz com que o solo arenoso seja sensível a erosão hídrica. Nesse caso, precisamos adotar práticas capazes de elevar os níveis carbono orgânico.
O aumento de carbono orgânico estabiliza e promove a agregação e aumenta a CTC do solo arenoso, sendo que, quando conciliado com a cobertura vegetal, mitiga a erosão, impedindo a degradação da área.
Em solo arenoso há menor volume de microporos e maior de macroporos, diminuindo a retenção de água e melhorando a drenagem.
Isso ocorre porque os fenômenos de capilaridade e adsorção responsáveis pela retenção e armazenamento de água ocorrem nos microporos, enquanto os macroporos possibilitam o fluxo de água e calor, beneficiando a drenagem.
Sendo assim, se considerarmos uma chuva capaz de atingir a saturação do solo arenoso, ele secará mais rapidamente do que àqueles com maior teor de argila, podendo acarretar problemas de déficit hídrico.
Entretanto, a irrigação é uma prática bem conhecida e dominada por nós, profissionais da área agrícola, não nos deixando vulneráveis aos eventos climáticos e sendo capaz de resolver os problemas de falta de umidade.
Em algumas regiões, o fato de o solo arenoso secar mais rápido pode ser positivo se considerarmos que a umidade excessiva da lavoura pode dificultar ou impossibilitar atividades como semeadura e preparo do solo que, geralmente, possuem janelas curtas de tempo.
Em contrapartida, a macroporosidade do solo arenoso permite boa aeração das raízes das plantas e quando aliada ao suprimento com quantidade e qualidade de água e nutrientes é capaz de gerar altas produtividades.
Manejo de solo arenoso para atingir altas produtividades
Sem dúvidas, nosso principal objetivo ao manejar o solo arenoso é aumentar os teores de matéria orgânica e isso pode ser possível com a adoção de sistemas de manejo como o Sistema de Plantio Direto.
A diminuição do revolvimento do solo, a manutenção de cobertura vegetal e aporte de resíduos vegetais ao longo do tempo são capazes de aumentar o carbono orgânico em solo arenoso.
No noroeste do Paraná, enquanto os solos sob mata nativa apresentam teores de carbono orgânico equivalentes a 1,2% (naturalmente baixos), o uso do solo para pastagem e cana-de-açúcar tem diminuído esses valores para 0,8 e 0,5%, respectivamente.
Considerando que a argila exerce um papel de proteção e estabilização do carbono orgânico no solo, esse é um processo mais delicado no solo arenoso.
Deste modo, observamos que podemos atuar melhorando os níveis de carbono orgânico ou os diminuindo até níveis críticos, dependendo da nossa tomada de decisão e manejo.
Portanto, a produtividade e a sustentabilidade do sistema produtivo são nossa responsabilidade, não da textura.
Outras estratégias de aumento dos níveis de matéria orgânica em solo arenoso incluem a aplicação de doses de materiais como lodos de esgoto tratados e dejetos de suínos ou de outros animais.
Isso se torna interessante quando consideramos que a destinação final desses resíduos comumente é um problema.
Diversos estudos vêm indicando que esses materiais são fontes de alguns nutrientes e não causam contaminação, sendo interessantes em casos específicos como os de regiões com elevada produção animal.
A adubação dos solos arenosos geralmente requer menores quantidades de fertilizantes, porém, não devemos esquecer que isso demanda uma frequência maior de aplicação, assim como o monitoramento do pH deve ser ainda mais rígido.
Possivelmente considerar mais de uma aplicação de K no ciclo da mesma cultura ou até mesmo o uso de fertilizantes folhares pode ser interessante.
A mesma lógica serve para a irrigação. Como o solo arenoso tem menores porosidade total e microporosidade, devemos diminuir a lâmina de água a ser aplicada e aumentar a frequência de irrigação.
No Mato Grosso, a região do Campo Verde tem demonstrado que é possível obter boas produtividades de soja mesmo em solo arenoso (3,5 ton ha-1), porém, a ocorrência de estiagem e a falta da irrigação acabam frustrando algumas safras.
Principais desafios para o manejo de solos arenosos
Talvez nosso primeiro desafio, mas não menos importante, é entender a importância do manejo diferenciado do solo conforme a textura. Compreender que aplicar 70 kg ha-1 de P não é a mesma coisa em solo arenoso e argiloso.
Só depois disso iremos perceber que um solo arenoso exige maiores cuidados quanto a ocorrência de degradação via erosão e quanto às estratégias de aumento e conservação da matéria orgânica.
A matéria orgânica é o agente capaz de beneficiar o solo arenoso química e fisicamente, dois dos pilares de uma lavoura produtiva e que gera lucros. Portanto, o aporte de biomassa vegetal não pode ser negligenciado em hipótese alguma.
Mais uma vez fica evidente que conservar, seja o solo arenoso ou argiloso, é essencial tanto para a sustentabilidade da atividade agrícolas quanto para obtenção de altas produtividades.
O fato de apresentar baixos teores de matéria orgânica também pode fazer com que haja deficiência de micronutrientes como o Boro. Nesse caso, é necessário o uso de fertilizantes que forneçam micronutrientes.
Temas como os efeitos do uso de gesso agrícola ainda precisam ser melhor entendidos pela pesquisa, assim como as melhores estratégias de aplicação.
Estima-se que o gesso, por ser mais solúvel, seja capaz de contribuir para a complexação do Al+3 em subsuperfície, fazendo com ele fique insolúvel e deixe de ser tóxico às plantas.
Existem relatos de altas produtividades em solo arenoso, logo, não será a textura que vai determinar o sucesso da lavoura e sim nossa capacidade de interpretar o sistema produtivo de forma integrada e tomar decisões especificas e pontuais conforme cada caso.