O primeiro relato que se tem notícia da febre aftosa ocorreu na Itália no século XVI, mais especificamente, em 1514.
Em território nacional, o primeiro relato sobre a febre aftosa ocorreu em 1895, na região do Triângulo Mineiro. Enquanto, o último ocorreu em 2006, nos estados do Paraná e Mato Grosso do Sul.
Apesar das campanhas para erradicar a febre aftosa, atualmente, a doença está largamente distribuída no mundo. Na região das Américas, os últimos casos foram relatados nos países vizinhos, Paraguai em 2012 e Colômbia em 2017.
Desta forma, sempre haverá um risco eminente de novos focos ou reintrodução da febre aftosa nas regiões produtoras de animais. Principalmente, no Brasil, que possui o maior rebanho bovino comercial do mundo.
A febre aftosa deixa em alerta constante todos os envolvidos no processo de geração da carne bovina. Especialmente, devido a sua capacidade para se disseminar com certa rapidez nos rebanhos.
Animais contaminados pela febre aftosa não podem ser comercializados como commodities agrícolas, o que resulta numa série de embargos ao comércio internacional. Para ter uma maior noção da complexidade da febre aftosa, considere a situação ocorrida em 1997:
A partir de um único suíno exportado de Hong Kong para Taiwan, a doença propagou-se por toda Taiwan em apenas 6 semanas. Neste país, foram abatidos mais de 8 milhões de suínos, o que resultou em um prejuízo de, aproximadamente, US$ 19 bilhões. Sendo, US$ 4 bilhões para erradicar a doença e outros US$ 15 bilhões em perdas comerciais.
Internacionalmente, este tipo de situação, quando realizado de forma intencional tem recebido a denominação de “Agroterrorismo“.
No Brasil, um surto de febre aftosa iniciado em 2005 levou vários países a proibirem a importação de carne brasileira, incluindo a Rússia, principal mercado do Brasil na época.
Durante este período, ocorreu uma queda no faturamento das vendas nacionais e internacionais. Posteriormente, uma queda no preço da carne no mercado interno devido ao excesso de oferta.
Isso afetou significativamente a gestão financeira de diversas propriedades agrícolas. Como consequência, pecuaristas deixaram o setor, o que também ocasionou queda na produção de bezerros nos anos de 2006 e 2007.
Você percebeu o quanto a febre aftosa pode impactar na economia brasileira e mundial?
Desta forma, vale a pena conhecer um pouco mais sobre as principais maneiras de identificar e prevenir a febre aftosa.
O que é febre aftosa?
Internacionalmente, a febre aftosa, também é conhecida por “Foot and Mouth Disease“. Esta doença é causada por um patógeno viral pertencente à família Picornaviridae.
A febre aftosa é altamente contagiosa e acomete naturalmente animais de casco bipartido ou biungulado (que possuem duas unhas ou dedos), domésticos e selvagens como:
- Bovinos
- Bubalinos
- Caprinos
- Ovinos
- Suínos
Felizmente, esta doença não tem forte potencial para afetar equinos, canídeos, felinos ou seres humanos.
Até o momento, se tem registro de 7 diferentes categorias de vírus, responsáveis por causarem a febre aftosa. No entanto, esta diferenciação só pode ser realizada em laboratório. Veja abaixo os tipos de vírus:
- O
- A
- C
- 1, SAT.2 e SAT.3 (isolados na África)
- Ásia 1 (isolado no Oriente Médio)
Além disso, dentro de cada tipo podem existir diversas variações ou subtipos, que ocorrem devido à grande capacidade de mutação do vírus. Até o momento, estima-se que existam mais de 60 subtipos do vírus e centenas de cepas diferentes
Após a infecção, o tempo de incubação da febre aftosa dura, em média, de 3 a 8 dias. Entretanto, dependendo do estado imunológico do animal infectado os primeiros sinais visíveis da doença podem surgir de 2 a 14 dias.
Desta forma, a febre aftosa possui potencial para dizimar rebanhos inteiros em poucas semanas. Uma situação que agrava ainda mais este cenário, é a capacidade que o vírus tem de permanecer viável em:
- Fezes
- Saliva
- Sêmen
- Tecidos do animal, como na carcaça de ovinos, por exemplo.
- Trato respiratório
- Urina
Além de tudo, a febre aftosa tem habilidade para ficar em estado latente em objetos inorgânicos que tiveram contato com o vírus. Sendo assim, pode permanecer no ambiente durante diversos meses, se as condições ambientais forem favoráveis.
Como a febre aftosa é transmitida?
A transmissão da febre aftosa ocorre de diversas maneiras. Entretanto, a principal forma de contaminação se dá, através do contato direto de animais doentes com animais sadios.
A capacidade de sobrevivência do vírus, faz com que ele possa ser transmitido para animais sadios das mais variadas formas possíveis, como por exemplo:
- Quando animais sadios são transportados em carrocerias contaminadas com o vírus.
- Quando, na sua alimentação são utilizados alimentados crus ou malcozidos, originados de carne ou subprodutos de animais doentes.
- Através do contato direto com pessoas utilizando vestimentas ou equipamentos infectados.
- Ingestão de água contaminada com o vírus.
- Durante a reprodução, quando animais forem inseminados com sêmen ou cruzados com animais doentes.
O vírus da febre aftosa pode permanecer na forragem contaminada e no meio ambiente por mais de um mês, dependendo da temperatura e do pH. Além de tudo, ele sobrevive a refrigeração e ao congelamento.
As poucas opções para a sua erradicação envolvem altas temperaturas e pH ácido menor que 6 e alcalino maior que 9. Produtos como desinfetantes químicos também são eficientes. Dentre eles, pode-se incluir:
- Carbonato de sódio a 4%.
- Ácido cítrico a 0, 2%.
- Hidróxido de sódio a 2%.
Em outras palavras, podemos considerar que a limpeza e higienização são essenciais para manter a sanidade dos rebanhos.
Outro fator importante a ser considerado é a elevada capacidade dos suínos em eliminar abundante concentrações dos vírus. Principalmente, se considerarmos que a disseminação também pode ocorrer via aérea.
Desta maneira, suínos doentes são potenciais fontes de disseminação a longas distâncias. Visto que, devido a capacidade de sobreviver a condições ambientais, o vírus da febre aftosa pode se disseminar por vários quilômetros sem perder a sua viabilidade.
Quais os principais sintomas da febre aftosa nos animais infectados
O nome da doença pode nos dizer muito sobre os principais sintomas. De modo geral, a febre aftosa causa febre e provoca o surgimento de vesículas, popularmente conhecidas como aftas.
Estas vesículas podem surgir em diversos locais nos bovinos, como:
- Na boca, línguas e lábios.
- Nos cascos.
Por isso, se traduzirmos ao pé da letra o nome da doença em inglês, “Foot and Mouth Disease“, teremos “doença da boca e dos pés”
Com o desenvolvimento da infecção, as vesículas tendem a estourar e, consequentemente, os sintomas tornam-se mais severos. Provocando salivação excessiva (babação), dor, cansaço e à fraqueza nas pernas.
Ao romper, estas vesículas evoluem para feridas avermelhadas, chamadas de erosões.
Grande parte dos animais infectados com a febre aftosa não morrem. No entanto, ficam bastante debilitados e com dificuldade de se levantar e se locomover.
A febre aftosa também provoca sintomas, que são comuns a outras enfermidades, por isso podem facilmente passarem despercebidos no rebanho, como por exemplo:
- Aborto.
- Redução na produção de leite.
- Perda de apetite e, consequentemente, perda de peso.
- Problemas cardíacos, em animais jovens, etc.
Animais como ovinos, caprinos e suínos também exibem sintomas semelhantes aos dos bovinos. Entretanto, os sintomas na boca destes animais são menos perceptíveis.
Na ovinocaprinocultura, a febre aftosa apresenta maior mortalidade de animais, principalmente, quando são acometidos ainda na fase jovem. Neste caso, os animais doentes tendem a ficar deitados.
Ao passo que na suinicultura, a febre aftosa causa inquietação. Além disso, as vesículas também podem surgir nos focinhos destes animais.
A febre aftosa tem cura?
Até o momento, não há tratamento capaz de eliminar o vírus dos animais doentes. Portanto, a melhor opção para prevenir a disseminação da febre aftosa é a o abate sanitário e sacrifício.
O rebanho bovino é extremamente suscetível a febre aftosa, por isso, quando um surto da doença ocorre, ela pode disseminar-se rapidamente. Sendo assim, prevenir a doença deve ser considerado como o único método viável para o controle.
O impacto financeiro nos custos de produção, com um único surto de febre aftosa é imensurável. Pois, todos os animais, mesmo os sadios, que tiveram contato com a fonte de contaminação, devem ser sacrificados.
Além disso, todas as instalações, produtos e áreas por onde este animal passou, devem ser descontaminadas. Nestas áreas, a circulação de pessoas e animais devem ser restritos.
Por isso, a principal recomendação para o controle desta doença é a prevenção, através de vacinas de imunização. Desta forma, a aquisição das vacinas deve ser um dos itens a serem incluídos no momento do planejamento do seu agronegócio.
A vacina contra a febre aftosa é aplicada com o objetivo de fornecer imunidade ao rebanho. Contudo, não impede que o vírus chegue até as zonas livres, já que ela não atua como repelente.
Mas isso não é tudo. Devemos levar em consideração que nenhuma vacina é 100% eficiente. Pois, já ficou comprovado em diversos momentos que, as regiões com rebanho vacinados não estão livres da ocorrência de surtos com febre aftosa.
Os surtos ocorridos no Brasil e no mundo comprovam isso:
- 2004: Pará
- 2005-2006: Mato Grosso do Sul e Paraná
- 2011-2012: Paraguai
- 2017: Colômbia
- 2019: África do Sul e China.
Vacinação como a principal forma de combater a febre aftosa
O programa de vacinação de bovinos é obrigatório na maioria dos estados brasileiros. Exceto para Santa Catarina, que desde 2007 é reconhecido pela Organização Mundial de Saúde Animal (OIE), como área livre de febre aftosa sem vacinação.
Nos demais estados brasileiros a vacinação deve seguir o calendário oficial. No momento, o calendário de vacinação de 2019 já está em andamento e pode acessado neste link.
Com o objetivo de manter o Brasil livre da febre aftosa, o Ministério da Agricultura tem desenvolvido ações com apoio do Programa Nacional de Erradicação e Prevenção contra a Febre Aftosa (PNEFA).
O PNEFA tem sido o principal aliado no combate à doença e conta com o apoio dos serviços agropecuários estaduais e de instituições da iniciativa privada.
Em 2018, o Brasil atingiu um marco histórico, com o reconhecimento dos estados do Amapá, Roraima, partes do Amazonas e do Pará (antigas zonas de proteção) como livres de febre aftosa. A partir de então, o país inteiro ganhou o título de livre de febre aftosa com vacinação, o que nunca antes tinha sido realizado.
Isso somente ocorreu devido ao excelente programa brasileiro de vacinação, que ocorre da seguinte forma:
- Campanhas de vacinação: são realizadas em todo o território nacional e ocorrem em dois momentos. Sendo, a primeira etapa realizada em maio e a segunda em novembro.
- Fiscalização das vacinas: é de responsabilidade do serviço agropecuário estadual a fiscalização da produção e qualidade da vacina, bem como as inspeções, controles e orientações para a comercialização e utilização do produto.
- Execução e o acompanhamento da vacinação: também estão sob responsabilidade dos estados. Entretanto, devem seguir as recomendações do MAPA.
Os dados preliminares da primeira etapa de vacinação de 2019 apontam para 98,34% de cobertura vacinal nos rebanho de bovinos e bubalinos contra a febre aftosa. Destacando-se o estado de Rondônia que, vacinou 99,99% do seu rebanho.
Estas informações comprovam que os agropecuaristas, até mesmo os da agricultura familiar, estão seguindo a regra o calendário de vacinação. Além de tudo, demonstra que todos estão dispostos a manter o status de país livre da febre aftosa.